As manadas desvairadas de São Luís

Ouço sons semelhantes ao de uma manada. Vejo elefantes, leões e toda a trupe correrem como se nada mais houvesse para trás. Correm como se suas vidas dependessem daquilo. No percurso, há muito empurra-empurra e esfrega-esfrega, mas tudo aquilo já parece ter se tornado algo comum para aquelas criaturas. Olhando, fico assustada, apesar de já ter visto aquela cena antes. Para mim, é sempre é muito abissal aquela conduta. Não, não se trata de um documentário do Discovery Channel, trata-se do comportamento quase animalesco visto atualmente nos Terminais de Integração de São Luís, paradas de ônibus ou mesmo dentro dos próprios coletivos.
É claro que o principal motivo para que essa cena bizarra se revele todos os dias - quase com horário marcado - decorre do sofrível sistema de transporte público da capital. Com veículos insuficientes para um número crescente de usuários, esses lugares acabam se tornando um caldeirão de horrores.
Por esse motivo, tenho detestado cada vez mais utilizar esse meio de locomoção. Faço o possível e o impossível para não precisar utilizá-lo, sobretudo em horários de pico, quando a manada se aglomera e fica ainda mais ouriçada. Para isso, quando não há caronas de mãe, namorado ou amigos – e enquanto meu próprio carro não se encaminha – tenho gasto mensalmente, sem arrependimento, centenas de reais com táxis e motos-táxi.
Calor, aperto, horas de espera e tumulto. O usuário do transporte ludovicense - vulgo “banheiras do demônio” –, tem de pagar ainda R$2,10 por um serviço detestável. Muitos ainda arriscam suas vidas, indo praticamente pendurados na porta. A situação é ainda pior em bairros periféricos, onde as linhas são ainda mais reduzidas e, conseqüentemente, a tendência de manadas de formarem torna-se assustadoramente maior.
Semana passada estava eu no Terminal de Integração da Praia Grande – o maior dos cinco (Praia Grande, Cohab/Cohatrac, São Cristóvão, Cohama e Distrito Industrial) existentes em São Luís – e novamente fiquei horrorizada com o que vi. Muitos transformaram aquilo em um pardieiro, como já diria minha tia. Gente correndo, ônibus parando na casa da mãe, fiscais enfiados em buracos na esperança de se esconderem, motoristas mal-humorados, crianças chorando, gente utilizando o espaço como igreja evangélica, residência, motel e, por fim, como lugar de comércio livre para venda de todo tipo de coisa.
Filas enormes, muito barulho, sujeira, ferrugens. A má-educação reina e não me venham com “o poder público não oferece instrução, por isso a população age assim”. Para mim, mesmo com as dificuldades no transporte da cidade e as condições duvidosas das salas de aula fincadas em terras tupiniquins, nada justifica o comportamento daquela gente. Quando me vejo por ali, só penso uma coisa: a população ludovicense transformou-se em uma manada desvairada.
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Thamirys D'Eça
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As fotos - extraídas do blog do Ronaldo Rocha - mostram a situação dos usuários no Terminal de Integração do São Cristóvão.

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Seis coisas que você não sabe sobre mim


Recebi há alguns dias uma brincadeira da Ana Coaracy, mas só agora tive tempo e mente ponderada para escrever sobre coisas que a maioria não deve saber sobre mim. Algumas delas foram um tanto difíceis de publicar, pois me envergonham um pouco, mas agora já era. Leiam abaixo as revelações:

1- Quando criança, eu chorava todos os dias na escola. Isto porque os meninos da minha sala me agarravam e beijavam a força na hora do recreio. No jardim II – como se chamava na época – eu perdi totalmente a vontade de ir à escola. Para eu permanecer lá – Colégio Batista (João Paulo) – mamãe ia todos os dias me deixar, voltava à escola no horário do recreio, ficava lá durante todo o tempo do intervalo e depois ainda ia me buscava na hora da saída. Mamãe permaneceu nessa rotina durante quase um ano.

2- Eu tenho sérias repulsas à sujeira. Já houveram vezes em que entrei em pânico e comecei a chorar quando tinha que ficar em determinado local. Há alguns anos atrás, eu já cheguei a banhar entre 6 e 8 vezes por dia. Essa semana mesmo não quis deitar em uma cama porque ela estava aparentemente empoeirada. Troquei a colcha, mas quando deitei, senti coceira pelo corpo. Então, coloquei ainda o lençol para deitar em cima, mas a agonia continuava. Tudo isso só parou quando me convenci que era psicológico.

3- Eu sinto febre quando estou triste, zangada ou muito ansiosa. Sinto um frio tão grande que por vezes tremo. Pego dois lençóis para me cobrir, mas o frio continua. Quando demora muito a passar a febre e o frio, tomo remédio.

4- Não ando a noite – sobretudo após as 21h30 que já não tem gente circulando - sozinha na rua. Evito até acompanhada. Só saio esse horário pela rua se for de carro ou táxi. Quando não tem jeito, fico olhando para todos os lados, ando rápido, por vezes corro e se surgir alguém suspeito por perto, me tremo. Peguei trauma desde que fui assaltada uma vez por um motoqueiro armado. Aliás, motoqueiro é algo que tenho profunda repulsa.

5- Eu falo dormindo. Não sou como grande parte das pessoas que falam coisas sem sentido. Eu comento determinado assunto, questiono. Quando estou muito cansada, tendo a falar mais. Quando eu passei dias e dias no carnaval deste ano trabalhando, por exemplo, eu dizia, dormindo, que tinha que ver os blocos carnavalescos, ver quais desfilaram na passarela e que tinha que fazer a matéria. Quando criança, eu tinha ataques de sonambulismo. Já sentei em cima do meu tio dormindo e já detonei um vaso de flores artificiais da minha avó – tirei as flores e comecei a tirar toda a areia de dentro dizendo que estava procurando meus chinelos, sendo que eles bem do meu lado.

6- Eu quero casar e ter dois filhos. Já escolhi o nome de ambos – Joaquim (apesar de ter tido uma recente queda pelo nome Pietro) e Maria Clara. Não quero ter filhos depois dos 30 anos porque quero vê-los crescer. Não acho que viverei tanto tempo, então, tenho que tê-los em um futuro não tão distante.


Tem ainda várias coisas que deixei de falar porque, afinal de contas, a brincadeira limita até seis o número de revelações.

André Sales Lisboa, Carla Said, Wilson Lima, Ronaldo Rocha, Cézar Scanssette e Douglas Júnior podem fazer suas revelações também.
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Thamirys D'Eça

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Almas desoladas

Não sei onde estou com a cabeça que não te viro a mão na cara. Não, não tenho ódio de você. Você não merece meu ódio. Só os bons merecem ser odiados por mim. Não, não quero que me achem sublime e minha modéstia, na verdade, não liga para tal. Eu tenho pena de você, ó pobre alma desolada.
Tenho é raiva dos recalcados. Eles são sempre tão repugnantes e não sei o porquê de no decorrer da minha vida eles insistirem em me perseguir. Desde o jardim de infância lido com a inveja alheia. Olhe, olhe, eu só tinha cinco anos. Nessa idade, eu fugia dos meninos que insistiam em me beijar na hora do recreio e queriam ser o meu par no concurso de “Princesa da Primavera do Colégio Batista Daniel de La Touche - 1993”. As meninas, por sua vez, me olhavam torto desde que fui escolhida para competir pelo título e o ganhei – ó grande prêmio! Eu chorava. Hoje, não choro mais. Eu tenho pena dessas pobres almas desoladas.
Olhe para você. É um nada e nada tem a mostrar. Cadê seu brilho? Cadê seus amigos? Cadê sua vergonha? Ah, não tem. O que tens? Um batom vermelho que te faz parecer puta, sobretudo nas manhãs de sol. Porque alguém usa um batom vermelho numa manhã? Gostaria de entender. Coisa de pobres almas desoladas.
Tenho é raiva dos sebosos. Cobertos de sujeira e sempre aborrecíveis. Quando passam, roubam seu humor, sua plenitude. Expelem suas frustrações, te colocam para baixo. Quando falam, é detestável, mas quando te olham é ainda pior, te reduzem. Imagine se valessem algo. Ó, pobres almas desoladas.
Olhe para você. A falsidade se percebe de longe, pelo riso, pelo andar. Não tens personalidade nem na escolha de um óculos escuro. A única personalidade que pensas ter é na escolha da tintura do cabelo ou do batom vermelho que te faz parecer puta, sobretudo nas manhãs de sol. Ora, não precisa se fingir de coitada, porque sua existência já é digna de pena. Ó pobre alma desolada.
Tenho é raiva dos ínvidos. Cobiçam o que tu tens, te murcham. Mas eu entendo porque és assim. Não tens nem uma bunda, quanto mais orgulho de si ou para si. Só resta a pretensão mesmo. Conseguem só pena essas pobres almas desoladas.
Olhe para você. Rasteja, não tem amor-próprio. És venenosa e seu veneno não tem classe alguma. É brega, dispensável, deselegante. És malvada, mas sua malvadeza não tem estilo, pose, glamour. É baixa, perversa, cruel. És também irônica, mas tua ironia não tem charme e muito menos atitude. Não és refinada o bastante para ter uma ironia admirável.
Tenho é raiva dos depressivos. Sempre se acham sofredores e se sentem sempre carentes e insatisfeitos. Mas pudera, afinal, suas vidinhas sem graça, sem perspectivas e claro, amargas, imperam. De cara logo se nota que dali não mais evoluirão. Ó, pobres almas desoladas.
Pelo menos, você tem sorte. Devias comemorar que não sou asquerosa que nem tu. Devias comemorar que minha “nigrinhagem” é classuda e não reduzida como a sua. Devias comemorar que eu por ti não tenho ódio, só pena da sua alma desvairada, solitária, infeliz e desolada. Senão, sinceramente, eu perderia a cabeça e te viraria a mão na cara.
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Thamirys D'Eça
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Depois de alguns comentários - de Silvia Moscoso... eu falo é "mermo"! rs -, resolvi salientar que: Este texto fiz há muito tempo atrás. Por algum motivo, gosto dele. Pode parecer estranho, mas sinto-me bem ao lê-lo. O encontrei jogado dia desses em um canto do computador e como o blog estava desatualizado, resolvi postá-lo.

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A fetidez do Centro Histórico

O Centro Histórico de São Luís – fede. Antes não fedia tanto, mas hoje, fede. Fede não só pelos esgotos que insistem em exalar seu odor livremente pelas ruelas históricas ou por conta dos hippies que não se lavam desde a última passagem do ônibus que conduzia à Woodstock. Fede à mesmice, libertinagem, intelectualóides e maconha bem enrolada.

Semana passada, depois de sair da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – outro lugar de odor semelhante – me fui pega por uma vontade incontrolável de comer. Parei no Reviver para procurar algo atrativo ao meu paladar. Durante a procura, não vi nada novo. Nem lembro a última vez que havia ido lá, em uma tarde já com o sol se pondo, sozinha e sem pressa, mas sei que estava exatamente igual ao cenário visto por mim neste derradeiro episódio.

Ora, a única uniformidade que deveria existir por lá seriam os casarões. Porém, são estes que já não são os mesmos. Estão com lodo, urina, pintura desgastada, azulejos deteriorados. Graças a este conjunto arquitetônico, o Centro Histórico de São Luís foi tombado na década de 90 como Patrimônio Mundial pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Hoje, a cidade está ameaçada de perder o título. Na verdade, não o ganharia nem se fosse um título dado regionalmente, quanto mais mundial.

Sendo talvez um pouco saudosista, sou do tempo em que o trailer de cachorro-quente do Souza era na rua do Odylo Costa Filho. Sou do tempo das ruas bem iluminadas. Sou do tempo do cheiro de couro de animal, encabeçando os tambores dos coreiros de tambor-de-crioula, tostando de afinação à beira da fogueira. Sou do tempo dos intelectuais sentados nos bancos da Praça Nauro Machado, ou tomando uma cerva no Antigamente e na Cia. Paulista. Sou do tempo em que o Chez Moi eram para os ditos alternativos.

Desta última vez que passei pelos paralelepípedos bem encaixados daquele lugar, não vi nada disso. O que vi são as mesmas camisas de Che cobrindo os peitorais magrelos, as de um crioulinho qualquer nas cores da Jamaica estendidas à venda, as sandálias de couro surrado nos pés de unhas mal cortadas, os bêbados sempre nas mesmas viagens rasteiras que os levam a cair no mesmo canto da sarjeta, as mesmas miniaturas dispostas nas bancadas de compensado sustentadas por talas de bambu, os mesmos casais menino-menino ou menina-menina ou, ainda, menimo-menina-menino se atracando nas escadarias e o forte cheiro dos baseados para pobre.

O fato é que tenho reclamado por esses tempos de pessoas que se prendem ao passado, mas como era bom ir ao Centro Histórico. Quando criança, ia com mamãe, seu até então marido e minha irmã. Lembro-me que adormecia no colo materno ao som dos acordes característicos da vida noturna daquele local e, quando acordava, já estava a caminho de casa. Depois, mais crescidinha, já ia sozinha, mas sem muita freqüência. Quando entrei na UFMA, em 2007, voltei a freqüentar mais ativamente, mas a decadência do lugar logo fez com que enjoasse de ir pelas bandas de lá.

Minha tarde opcionalmente solitária no Reviver esta semana serviu ainda para eu relembrar outras coisas. Pode parecer estranho, mas o fedor de esgoto me fez lembrar Recife (PE). Chico Science não cantou os versos “Num dia de sol Recife acordou com a mesma fedentina do dia anterior”, na música A Cidade, à toa. “Recifede”, como alguns brincam, realmente não cheira bem, mas é um odor ruim tão bom porque o lugar te acolhe de outras formas. O Centro Histórico daqui, no entanto, hoje em dia, a mim só fede.

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Thamirys D'Eça


Foto: Flora Dolores, da equipe de O Estado

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Eleita hoje a Miss Brasil 2010. Camila Ribeiro representará o Maranhão.

O que para muitos é uma mera futilidade, para outros é um sonho de vida. Acontece hoje, no Memorial América Latina, em São Paulo, a eleição da mulher mais bonita do país. Vinte e sete candidatas disputam a coroa e a oportunidade de representar o Brasil no Miss Universo, ainda sem data e local definidos. A maranhense Camila Ribeiro, 20, está confiante na vitória.


Para este ano, o concurso nacional, organizado pela Gaeta Promoções e Eventos, promete surpresas. Os trajes casuais irão homenagear grandes estilistas brasileiros e farão referência à Copa do Mundo. As misses desfilarão ainda em traje esportivo, roupa de gala e maiô.
Depois dos desfiles, os jurados selecionarão 14 misses para a segunda etapa. A 15ª será escolhida pelo público por telefone (014 41 84010401), mensagem de texto (72260) e internet. Em seguida, as 15 finalistas voltam a desfilar e 10 serão escolhidas. Em mais uma rodada, ficarão apenas cinco meninas, que serão entrevistadas e receberão o anúncio da vencedora do concurso. A ganhadora receberá um carro zero quilômetro e R$ 200 mil em contratos de trabalho.
Afora os regionalismos, estou torcendo pela Camila Ribeiro, representante maranhense no concurso. Tive a oportunidade de entrevistá-la (leia a entrevista-perfil abaixo), dias depois de ser eleita Miss Maranhão. A menina é um encanto. Além de possuir traços perfeitos, altura ideal, medidas invejáveis, é um poço de carisma e possui uma história de vida bastante peculiar. Confira abaixo toda a sua trajetória:



Thamirys D’Eça
Da equipe de
O Estado

“Quando eu me olho no espelho, penso: ‘Como eu sou bonita’”. Se para muitos a frase poderia soar como ausência de modéstia, com Camila da Silva Ribeiro acontece diferente. Quem convive com a moça de 1,80m de altura, 65 centímetros de cintura, 94 centímetros de quadril e 86 centímetros de busto só tende a concordar com a frase recitada matinalmente. Esbanjando - além da beleza nata - charme, elegância e porções colossais de carisma e humildade, ela já viveu muitas situações peculiares no decorrer dos seus 20 anos de vida. Estas vão desde descobrir que foi adotada até ser eleita Miss Maranhão 2010.
Olhando a negritude e os cachos de tons avermelhados e esvoaçantes de Camila Ribeiro, é natural pensar que, para uma moça tão bela, poucas dificuldades se estabeleceriam. Porém, a sua luta começou desde muito cedo. Camila Ribeiro foi criada, desde os 7 anos, no São Raimundo, um dos bairros periféricos de São Luís. Com muito amor recebido da mãe Maria Celeste Ribeiro, ela imaginava que teria a sua passagem pela Terra como um acontecimento normal, sem muito alarde. Estava matriculada em uma escola pública da capital, a Fundação Nice Lobão – Cintra - e levava uma vida comum.
Na escola, os professores e demais alunos já notavam a formosura da pequena Camila e até chamavam-na de “modelo”. Ela gostava e se esforçava para ser merecedora do elogio. Brincava de desfilar e, nos intervalos das aulas, de bonecas, como toda menina. “Pegava comida de verdade na cozinha e passava horas e horas brincando. Claro que era um desespero quando me viam pegando aquilo tudo para somente brincar, mas eu ficava quietinha. Então, acabavam deixando”, conta.
Assim seguiu-se, tranqüilamente, a existência de Camila Ribeiro. O que ela não esperava é que aos 9 anos sua vida mudasse completamente. Na verdade, sua história ganhou destino diferente logo depois dos seus dois primeiros dias de nascida. Valquíria Conceição, após dar à luz Camila Ribeiro, resolveu, por motivos financeiros e familiares, passar a responsabilidade da criação de sua filha a Maria Celeste Ribeiro, que a adotou imediatamente ao vê-la no berçário.
O fato, porém, sou se tornou de conhecimento de Camila aos 9 anos, quando sua mãe adotiva apresentou a menina à sua mãe biológica e aos cinco irmãos. “Eu os conheci, mas até então não sabia de nada. Pensava que eram amigos da minha mãe. Depois ela me chamou e me contou que a mulher era minha verdadeira mãe. Ela disse que uma enfermeira perguntou se minha mãe teria condições de me criar e se não queria dar para a adoção. Foi quando ela soube e me adotou, já que não podia mais ter filhos e queria muito um filho do sexo feminino. Eu parei, fiquei em choque”, disse, emocionada.
Se para a maioria somente esta história já bastaria para uma vida adversa, com a de Camila Ribeiro há sempre o que se acrescentar. Além de descobrir que era filha adotada e que Maria Celeste e Raimundo Ribeiro não eram seus pais verdadeiros e Coulbert Ribeiro não era seu único irmão, ela ainda soube, na mesma ocasião, que tinha um irmão gêmeo, Sérgio Conceição. “Nem mesmo a minha mãe biológica sabia que esperava gêmeos. Ela não fez o acompanhamento de pré-natal. Primeiro nasceu o Sérgio.Depois ela soube que ainda havia eu”, relata.
Depois das notícias, a tranqüila Camila, que se conformava em ficar brincando sozinha de casa de bonecas no quintal, transformou-se. “Eu comecei a dar muito trabalho. Não queria mais ir para à escola. Tive que fazer tratamento psicológico”, revela. Somente aos 12 anos, Camila Ribeiro aceitou iniciar uma conversação mais amena com sua mãe biológica e aceitar melhor a sua condição. Com o pai, o pedreiro João Góes, o diálogo aconteceu apenas aos 15 anos, quando ela o procurou. Hoje, ela tem uma boa relação com os familiares. “Hoje em dia eu amo minha família biológica”, resume.
Passarela - Depois de toda comoção das famílias, aos 15 anos, Camila resolveu deixar para trás as amarras do passado e se dedicar àquilo que ela desde criança almejava: subir na passarela. Com estímulo da mãe e de alguns amigos, ela entrou em contato com Márcio Prado, fotógrafo do ramo. Até hoje, ela permanece sob cuidados do profissional. Seu primeiro desfile foi aos 15 anos, no encerramento de um curso para modelos.
Com o passar dos anos, a Miss Maranhão 2010 foi se aperfeiçoando – desfilou apresentando grifes de lojas conhecidas instaladas em São Luís - e também realizando atividades paralelas. Aos 17 anos, fez a sua primeira viagem profissional para um concurso de beleza realizado por uma marca de produtos de higiene pessoal, bucal e de limpeza, na Bahia. Aos 18, começou a participar, por influência da mãe, do grupo de Bombeiros Mirins, que realiza atividades de acampamento e de caráter social.
Foi nesse âmbito também que a mãe de Camila Ribeiro a incitou a participar das atividades da escola que fundou e que atende a crianças de baixa renda de 2 a 10 anos. A pequena instituição funciona há 15 anos e a Miss causa um verdadeiro frisson quando passa pelo local. “Quando vou chegando, as professoras pedem para eu nem entrar porque, se as crianças estão quietas, quando me olham ficam muito agitadas. Chego e tenho que beijar todos. Um por um. Já aconteceu de me falarem: ‘Tia Camila, a senhora é tão grande. Quando eu crescer quero ficar do seu tamanho’”, diz, orgulhosa.
Maranhense, Camila Ribeiro também se dedica a outra paixão, a música. Ela adora reggae e afirma dançar bem. Ela não perde uma noite de domingo no bar Chama Maré – clube de reggae no bairro da Ponta d’Areia. “Agora vou ter que parar de ir lá um pouco por causa dos deveres de Miss, mas eu adoro”, lembra. Ela também aprecia o som da Música Popular Brasileira, nas vozes de Adriana Calcanhotto, Marisa Monte, Alcione e Zeca Baleiro. Porém, ela não tem muitas oportunidades de ir a shows. Os únicos a que ela foi foram os apresentados este ano no Festival Nacional de Samba do Maranhão, realizado no mês de março.
Trabalho - Há 9 meses Camila Ribeiro começou a trabalhar como consultora de vendas de um plano de saúde, para ajudar na renda familiar. Este foi um dos principais motivos para ela se negar a participar do concurso Miss Maranhão. Foi só com muita insistência da mãe, dos amigos, do namorado e dos que a acompanham no estúdio em que desenvolve suas atividades de modelo, que ela resolveu entrar, há poucas semanas da competição, na disputa pelo título. “Eu não podia perder o meu emprego. Lá, depois que souberam que estava participando do Miss Maranhão, todos ficaram alegres. Também fiquei preocupada em ter que gastar muito. Pensei que teria que arcar com muitas despesas. No ano passado, insistiram para que eu participasse, mas não quis. Fiquei na recepção do evento e as pessoas diziam: ‘Mas o que você faz aqui? Você tinha era que estar lá em cima’”, fala, entre risos.
Depois que finalmente aceitou a proposta, no último dia do recebimento das fotos das candidatas, Camila Ribeiro começou a se preparar para a disputa pela faixa de mulher mais bela do estado. Ela passou por uma bateria de ensaios e de fotos. “Foi um processo difícil. Trezentas e oitenta meninas se inscreveram e só restaram 10 no concurso, que eram muito bonitas. Mas valeu a pena todo o esforço”, ressalta. A recompensa a que ela se refere é a faixa de Miss Maranhão 2010.
Agora, Camila Ribeiro só tem um pensamento: participar, no dia 8 de maio, no Memorial da América Latina, em São Paulo, do Miss Brasil 2010, que acompanhava somente pela televisão desde os 15 anos. Bonita, confiante, vaidosa e decidida, ela assegura que irá em busca do título nacional. “Me sinto uma diva quando estou desfilando. Adoro a passarela. Vou levar meu diferencial para São Paulo. Já me imagino entrando na passarela. Representarei um povo, uma cultura, uma historia”, fala.
Ansiedade na noite inesquecível - Perguntar para Camila Ribeiro qual foi o momento mais memorável da sua carreira é obter com segurança uma resposta objetiva e sem demora. A ocasião tem data e lugar. Aconteceu na noite do dia 10 de abril de 2010 no Teatro Zenira Fiquene, na Faculdade Atenas Maranhense (Fama), quando a modelo e consultora de vendas recebeu de Thaís Portela – Miss Maranhão 2009 – a coroa de Miss Maranhão 2010.
Porém, os momentos que antecederam o reconhecimento do título foram sofridos para Camila. Tamanha era a ansiedade que ela chegou até a arrancar parte da unha com as mãos. “Estava confiante, mas a Maina me deixou um pouco preocupada na hora. As outras meninas estava lá atrás, torcendo, gritando meu nome ‘Camila, Camila’ e quando saiu o resultado, foi muita emoção. Eu queria chorar e não conseguia. As lágrimas só conseguiram descer quando olhei minha mãe”, conta.
O título teve ainda o sabor mais especial porque Camila Ribeiro é a terceira negra – a primeira foi em 1974 e segunda em 1999 - a receber a faixa de Miss Maranhão em 60 anos de concurso e a primeira a realizar este feito neste século. “Sei que não fui eleita pela minha cor, mas sinto que agora sirvo de exemplo para várias meninas que se sentem discriminadas e que agora irão se aceitar, se valorizar e se amar mais. Isso para mim é uma responsabilidade grande e uma honra”, disse.
“Representar o Maranhão não vai ser difícil porque o povo aqui é valente, guerreiro e que não desiste. Eu sei disso e levarei tudo isso para São Paulo, no Miss Brasil”, afirma.
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Matéria publicada em O Estado
do Maranhão, no dia 18 de abril de 2010


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Entre teclas e letras, sobrou o blog

Aprendi a ler e a escrever aos 5 anos e, desde esta idade, tenho acesso ao computador. Minha tia, hoje doutora em Letras, meio enciumada do aparelho de tela colorida atrativa a qualquer criança, privava-me quase sempre de apertar incontroladamente os botões do teclado e fazer acender e apagar as luzes do monitor, que durante a tarde quando o sol estava para se pôr e o quarto começava a ficar escurecido, tornavam-se ainda mais encantadoras. Sempre curiosa e muito intrometida, eu teimava em mexer naquele treco que sabia que era caríssimo. Sabia que pegaria uma bela palmada se alguém descobrisse, mas não me desfiz da idéia.
Depois de ganhar a confiança da tia, passei a ter mais intimidade com o equipamento. Ele, assim como eu, foi evoluindo. Eu crescendo, ele diminuindo de tamanho. Em seguida, titia, por fim, resolveu colocar internet. Ela dizia: “Computador sem internet é corpo sem alma”. Eu, assim como minha irmã, comemorei. Até hoje achamos a internet algo espetacular, por isso, brigas para usar o computador até hoje existem. Aliás, a briga evoluiu verbalmente e agora tem riqueza de adjetivos.
Com cerca de 8 anos, revezei as atenções entre o maravilhoso Super Nintendo, os livros e o computador. Assim seguiu-se. Jogava Super Mario Bros, lia Cora Coralina e mexia no computador. Um dia, porém, já passeando pela adolescência, em uma das inúmeras viagens da minha tia, nosso computador – a essa altura já o tinha como algo tão querido, que o considerava como meu também – foi roubado. Maldito roubo de cargas. Fiquei meses sem ter como usá-lo.
A tia, vendo, diante das suas atividades acadêmicas – que lhe proporcionaram adquirir uma biblioteca de número considerável de livros -, o computador como um parceiro indispensável, comprou outro. Aleluia.
O Super Nintendo já era coisa do passado e, mesmo que quisesse, não poderia mais jogá-lo, afinal, vovó colocou na cabeça que jogos são obra do demônio. Até hoje sou inconformada com isso.
Paralelo aos livros que a tia sempre me recomendara, apareceram, então, outras atividades, como o papos infindáveis do mIRC e ICQ e as publicações de fotos no Flogão. Descobertas várias funções do computador e já tendo conhecimento de alguns enredos de alguns livros, cresci mais um bocadinho. Eis que surge o MSN. Ai, como o adoro. Conversas, conversas, conversas. Como eu amo falar com as pessoas, relatar histórias, lê-las, refutá-las. Comecei a escrever também. Escrevia sempre que estava angustiada. Hoje me pergunto de onde vinha tanta angústia, para uma mocinha tão jovem. Não sei. Só sei que escrevia.
Anos, anos e anos nisso. Lia, escrevia e usava indiscriminadamente o computador. Agora, com meus 22 anos, trabalho como jornalista - um meio onde todo mundo tem um blog - e senti uma necessidade imensa de ter um espaço na internet. Ficava sem entender como alguém como eu, que gosto de computador, de contar história, de escrever e de ler a história alheia, não tenho um blog. Hoje, analisando bem, ponderei: Teimosia, insatisfação, impaciência e indecisão foram os motivos que retardaram de maneira incrível a existência de um blog meu, até agora.
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Thamirys D'Eça

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