Por não ter pai

Tenho pensado muito no meu pai estes últimos dias, apesar de não lembrar absolutamente nada da sua feição, o seu timbre de voz ou seus gostos musicais. Sei pouco dele e o que sei nem sempre são boas histórias. Por vezes até esqueço como se escreve seu nome. Se Luiz com S ou com Z no final.
Poucas fotos suas tenho no meu álbum e nenhuma lembrança dele tem em minha memória. Nem mesmo me sinto confortável em dizer “o meu pai”. Sinto-me estranha em pronunciar, afinal, nunca o chamei assim e nunca terei esta oportunidade. Não o sinto como “o meu pai” porque ele esteve distante desta que vos escreve desde muito cedo.
Quando apenas com um ano de idade meu pai se foi, minha memória dali nunca mais conseguiria guardar nada dele ou nutriria qualquer sentimento muito forte, real, contundente, inabalável. Dei-me conta estes dias que nem mesmo sei onde ele está enterrado. Não sei sequer qual foi a data da sua morte.
A única história que sei do senhor Luiz Carlos Júnior é do acidente que lhe tirou a vida. Sei que trafegava em uma BR e, em um sentido contrário, outro carro com farol alto lhe tirou a visão e fez com que perdesse o controle do automóvel, fazendo-o capotar seguidas vezes e morrer logo depois. Sei ainda alguns detalhes de sua vida, mas muito poucos. Muito, muito poucos. Mamãe não se presta muito à falar dele.
O fato é que meu pai se foi e nunca hei de voltar. Nunca poderei conhecê-lo, tocar seus cabelos impecavelmente lisos que herdei – mas que estraguei no decorrer dos anos –, perguntar como foi o seu dia, pedir um conselho, ouvir uma reclamação ou um elogio por eu ser uma filha dedicada aos estudos e esforçada em todos os outros campos desta quase nunca pacata vida. Seus olhos puxados nunca poderei comparar aos meus.
Orgulho-me por, apesar disso, nunca ter tido inveja das outras crianças quando agosto chegava e as escolas promoviam festinhas ao nosso gerador masculino. Nas comemorações eu ficava só, mas não me sentia mal por isso, apesar da compreensível incompreensão ocasionada pela pouca idade. Também não me constrangia elaborar presentinhos no colégio mesmo sabendo que não o entregaria ao meu pai. Nunca pude e nem poderei fazer isso.
Nestes últimos dias, porém, me arrombou um lamento por nunca poder dizer que “aprendi isso com meu pai”, “meu pai me ensinou isso” ou “eu fiz isso com meu pai”, como sempre ouço dos que me acompanham. Tudo que fiz, sei e me tornei aprendi com minha mãe e sua família. Pode parecer estranho, mas nunca havia sentido falta de ter pai.

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Thamirys D'Eça

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5 comentários:

Jock Dean disse...

Meu bem, não posso dizer que compreendo você, afinal, "compreender" está alguns passos além do "enteder" que o que posso fazer, neste caso.
Mas também não posso dizer que aprendi isso ou aquilo com meu pai, embora ele esteja vivo e eu o veja todos os dias, mesmo que morando em casas diferentes desde o meu nascimento.
A distância entre pais e filhos pode dá-se de inúmeras formas, a morte é uma delas, mas não a pior, por vezes.

Te amo.

Thamirys D'Eça disse...

Entendo, meu bem. Porém, quando se está vivo, se tem a oportunidade de consertar algo que por ventura esteja fora do seu eixo. Quando não se tem mais ar nos pulmões a possibilidade se torna nula.
Você, com o seu, pai aprendeu pelo menos que a distância existe e, com isso, passou a não esperar tanto dele. Isso não deixa de ser um ensinamento. Eu, por outro lado, não tive oportunidde de coisa alguma e não mais terei. Contudo, não lamento por não tê-lo. Só por não ter tido essa oportunidade.

Eu também te amo e você sabe que é enorme.

Unknown disse...

Também não posso me dizer do amor que tive de um pai, embora o meu esteja vivo, e as histórias que ouço dele não são muito agradáveis... é assim mesmo =/

Beijos zapa!

Thamirys D'Eça disse...

É... é assim mesmo, Larita. O importante é que apesar disso somos pessoas sãs(?!).

Anônimo disse...

olha
eu tb ñ tenho pai
fui criada pela minha mãe e pelo meu tio que adotei como pai
mas,aps seis anos ele me abandonou e depois disso eu me apeguei a todo mundo, mas todos tem a sua vaida, a começar pelo marido da minha visinha que quando eu me apeguei a ele a visinha engravidou,e o meu tio que adotei tb vai ter um filho.Passo a maior parte do tempo vendo minha irmã mais velha,minhas amigas, a filha da visinha(de 3 anos)ganhando de um tudo,roupa,sapato,leva elas no shopping,no cabelereiro,em shows(restart,JB,vxzero...)e eu aqui sem nada.então de vlor por pelo menos saber o nome dele,porque nem isso eu sei!!!!!!!!!!!

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